A Origem da Lux Direta

Por Jota Medeiros

Lux e Movimento. Diante da crise da representação, da pintura estática, o artista torna-se consciente desta realidade inerte, do movimento da luz estática nas artes, desde o cinema (do Gr. kinema), movimento, no século XX.

Já no final dos anos 1920, o russo Dziga Vertov, produz Um Homem com a Câmera, o que viria a ser a grande revolução do cinema mudo e do cine-documentário. Na época foi considerado “além da literatura e outras artes”.

Nas artes plásticas houve prenúncios marcantes dos construtivistas soviéticos, a exemplo de Gabo e Pevsner, os quais afirmariam que “o espaço e o tempo morreram hoje”. Nos anos 1930, o húngaro Moholy-Nagy, da Bauhaus germânica, segundo Mário Pedrosa, “abandonando o pincel e o figurativo, decidiu-se, após um pequeno estágio abstracionista, a pintar com a luz, numa audaciosa tentativa de realizar uma das mais velhas ‘utopias artísticas’”.

Abraham Palatnik, natalense de origem russo-judaica, nascido em 19 de fevereiro de 1928, iniciou as suas pesquisas da pinturacesa em 1949, quando abandona a pintura e produz os seus dois primeiros “aparelhos cinecromáticos”. Sob a influência do crítico Mário Pedrosa, em 1951, três anos após, apresentou o seu primeiro “aparelho Cinecromático”, durante a inauguração da primeira grande mostra de arte ibero-americana, a Bienal Internacional de São Paulo, na qual obteve menção honrosa do júri internacional.

A presença do “Cinecromático” na I Bienal foi uma verdadeira “aventura”, visto que o objeto de sedução trans/creativo e/ou trans/pictórico, não sendo pintura convencionalmente, figurativa e/ou abstrata, não foi aceito pela comissão e somente foi posteriormente introduzido.

Segundo o crítico e biógrafo carioca Luiz Camilo Osório, citando M.P.0 “o trabalho foi julgado numa sala do Museu de Arte Moderna de São Paulo, e decidiram que não faria parte da Bienal ‘porque não era pintura e não dava pra encaixar’”. Logo em seguida, encontrou-se com o artista Almir Mavignier, amigo formado pela escola de Ulm, que lhe comunicou a sua participação, sobretudo pela ausência da delegação do Japão.

Para Palatnik: “o Cinecromático condensa em si novas possibilidades na atividade artística, libertando o artista de uma fatalidade quase inevitável que é a limitação e redução da sua atividade às técnicas tradicionalmente conhecidas, e possibilita a realização concreta do problema do tempo, espaço, movimento e dinamismo”.

Segundo o crítico Jaime Maurício, enviado especial a XXXII Bienal de Veneza, em 1964, pelo jornal Correio da Manhã, “os painéis de Abraham Palatnik testemunham a extrema liberdade do artista, para o qual já não subsistem mais as etiquetas convencionais, nem fronteiras entre as diversas artes [o que tinha sido de resto previsto por Leonardo]. [...] Constituem uma espécie de lanterna mágica da nossa época; mas seus elementos não são fornecidos externamente, antes são elaborados com rigor pelo artista, que pretende conciliar espaço e tempo”.

Durante o supracitado evento, o crítico e poeta Carlo Belloli procurou o artista para checar a data original de seu primeiro Cinecromático. Constatada a data de 1951, Belloli corrigia então a informação vigente na Europa, que atribuía a Malina Schoffer o pioneirismo nos trabalhos com luz e movimento.

A I Mostra Internacional de Arte Cinética ocorreu em Paris, em 1955, na Galeria Denise René, reunido obras de Marcel Duchamp, Alexander Calder, Ives Klein, Tinguely e Abraham Palatnik, entre outros.

Seguiram-se outras exposições, na Suíça, Holanda e Iugoslávia, bem como grupos de artistas organizados, como o GRAV (Grupo de Pesquisa e Arte Visual) e os “Grupos Gestálticos”, na Itália; “Novas Tendências”, na Iugoslávia; “Grupo Zero”, na Alemanha; “The Responsible Eye”, nos Estados Unidos e “Dvijenie”, na União Soviética.

Para Popper, “a Arte Cinética se compõe de obra em movimento virtual (op) e real”. A Arte Cinética é também urbana, aproximando-se da Land Art (da paisagem) e do Happening (acontecimento) com o GRAV.

Happening, expressão criada pelo poemúsico norte-americano John Cage: “tudo o que fazemos é música, há teatro o tempo todo”. A Arte Cinética é performática na atualidade, aliando-se à vídeo-arte num procedimento inter-activo, à estética fractal e à poesia visual e/ou à nova poiesis. Já despertava o olhar dos poetas concretos, sobretudo Augusto de Campos, nos anos de 1950, quando Palatnik participou de três das quatro mostras do Grupo Frente realizadas no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, em 1955, e em Resende e Volta Redonda, em 1956.

Simultaneamente aos cinecromáticos, o artista produzia pinturas abstratas aliadas ao mobiliário. Posteriormente, desenvolveu objetos móbiles cinéticos e relevos com papéis que remetem às nossas dunas potiguares. Palatnik rompe com a pintura, formalmente, mas dá continuidade incursionando em seu discurso pictórico novos materiais e desenvolvendo novas propostas objectuais.

Percursor da Art Hight Tech, podemos citar como redimensionamento da pinturacesa a poética High Tech de alguns brasileiros, como Eduardo Kac (1986/87); Augusto de Campos e o espetáculo Poemix, do qual participaram Cid Campos, João Bandeira, Arnaldo Antunes, Leonora de Barros, e 2007; o vídeo Galáxias, fragmento intertextual do poema constelar homônimo do poeta concreto Haroldo de Campos, de minha autoria em parceria com o astrofísico Joel Carvalho, produzido na Oficina de Tecnologia Educacional da Universidade Federal do Rio Grand do Norte, em 1991.

A expressão se projeta para além da retina, ou, como diria Melo e Castro em Poética dos Meios e Art High Tech, “como ciência da definição do espaço não pode agora alhear-se dos problemas do espaço social da comunicação e dos suportes dessa comunicação, constituindo aquilo que se chama uma poética dos meios [...]”. Vemos a própria arte cinética como integrante da atual prática poética estendida aos mais diversificados multi-meios.

A expressão se projeta para além da retina, ou, como diria Melo e Castro em Poética dos Meios e Art High Tech, “como ciência da definição do espaço não pode agora alhear-se dos problemas do espaço social da comunicação e dos suportes dessa comunicação, constituindo aquilo que se chama uma poética dos meios [...]”. Vemos a própria arte cinética como integrante da atual prática poética estendida aos mais diversificados multi-meios.

ESPAÇO VIRUTAL O Museu Abraham Palatnik (www.nac.ufrn.br), iniciado em fevereiro de 2006, tem como propósito homenagear o artista pioneiro da arte/tecnologia do Brasil. Reunindo obras de arte/multimedia que constituem em primeira instância o acervo do artista Jota Medeiros. É um museu em processo, que se amplia através de doações, interações e produções laboratoriais. Esta idéia de museu vem materializar-s a partir da Multimidia/UFRN, realizada em 1983, evento que apresentou propostas desde a Arte-correio à Computer Art; das intervenções urbanas às oficinas de multimeios; shows performáticos; Mostra Internacional de Artdoor “Natal em Natal” da qual participaram artistas nacionais como Volpi, Mauricio Nogueira Lima, Bruscky & Santiago, Raul Córdula, Regina Silveira, João da Rua, Flávio Freitas, Afonso Martins, Marcelus Bob, Fernando Gurgel, entre outros dos sessenta artistas convidados. Da poesia marginal à arte carimbo; da xerografia à heliografia; do S8 à vídeo-arte; do livro de artis às revistas de invenção; ocupando o espaço urbano da Cidade do Natal em sincronia com o Festival de Artes no Forte dos Reis Magos. O espaço virtual do MAP acha-se aberto a memória a-temporal da arte em seus múltiplos processos interativos.

Jota Medeiros é Mestre em Literatura pela UFRN e idealizador e curador do Museu Virtual Abraham Palatnik do NAC/UFRN.

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